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Blog da Sophie Deram

Veja se redes sociais são boas ou ruins para autoestima e imagem corporal

Sophie Deram

21/08/2019 04h00

Crédito: iStock

Há cerca 1 mês, uma das redes sociais mais populares no Brasil, o Instagram, resolveu ocultar o número de curtidas nas suas postagens. Segundo a página, a decisão foi tomada pensando no bem-estar das pessoas. Elas sofrem muita pressão social e as curtidas podem desviar a atenção da foto e gerar um clima de competição. Essa medida já está sendo testada em outros países, mas há quem diga que se trata, na verdade, de uma estratégia para tornar o feed do Instagram mais atraente.

Independentemente do motivo dessa mudança, há muito tempo as mídias têm sido uma preocupação para a autoestima e para a imagem corporal das pessoas, sendo tema de estudos científicos em todo o mundo. Antes, o foco estava nas revistas femininas e suas modelos magérrimas, hoje, nas redes sociais, onde os próprios usuários produzem e postam o conteúdo. A plataforma Instagram, por exemplo, permite a qualquer um editar suas imagens através de filtros, melhores ângulos e aplicativos que formatam as fotografias. Com todas essas propriedades, não é uma ideia absurda pensar que as redes sociais afetam nossa imagem corporal e autoestima.

O efeito do "curtir" na autoestima

Nas redes sociais, o ícone "curtir" ou "like" chama bastante atenção das pessoas pelo seu poder gratificante, podendo ser um sinal de aprovação, reconhecimento e recompensa.

Pesquisadores realizaram um estudo no sul da Espanha com o objetivo de analisar a influência das curtidas na autoestima e no uso problemático do Instagram. A pesquisa foi realizada com 244 adolescentes, que responderam um questionário contendo perguntas e afirmações sobre o uso do Instagram e sobre autoestima.

"Eu uso o Instagram para me sentir melhor quando estou para baixo", "Tenho dificuldade em controlar a quantidade de tempo que gasto no Instagram", "É comum sentir que sou um fracasso", "Estou satisfeito comigo mesmo e sou capaz de fazer coisas assim como a maioria das pessoas" eram algumas das frases que os os participantes deveriam avaliar e indicar o quanto concordavam com elas.

O estudo concluiu que as curtidas estão associadas ao uso problemático do Instagram (uso compulsivo, vício, dependência) e à baixa autoestima e o impacto dos likes é menor nos jovens que apresentam autoestima elevada. Os resultados também permitiram discussão com outros estudos que trazem relações entre o uso das redes sociais e estresse, depressão, e insatisfação corporal. No entanto, é necessário que sejam feitas mais investigações, com populações maiores e que possam analisar esses fatores ao longo do tempo.

Inspirações problemáticas

Como sabemos, a autoestima é um indicador importante de saúde mental. Trata-se de uma avaliação que fazemos de nós mesmos e reflete como nos vemos. A autoestima tem bastante relação com a imagem corporal, ou seja, com o modo como percebemos a nossa aparência e o nosso corpo. Quem tem uma autoimagem negativa é comum desenvolver uma baixa autoestima.

Frequentemente encontramos nas redes sociais (Facebook, Twitter, Instagram, Tumblr) imagens – muitas vezes editadas – de corpos atraentes e com padrões de beleza inatingíveis. Parte dessas fotos podem trazer a indicação de "thinspiration" ou "fitspiration". "Thinspiration" refere-se ao conteúdo de mídia social baseado em imagens que idealiza e promove a magreza corporal. Já "fitspiration" tem foco em corpos magros, mas com musculatura aparente. A intenção é "inspirar" pessoas a serem magras ou "fit".

É possível que a exposição a esse tipo de imagens contribua para a insatisfação corporal, impacte negativamente o funcionamento afetivo e agrave sintomas de transtornos alimentares. É o que concluiu uma pesquisa publicada no mês passado. O estudo foi realizado na Austrália, com 128 estudantes de graduação, entre homens e mulheres. Os participantes responderam durante uma semana a questionários, enviados a partir de um software, contendo informações sobre exposição a imagens de fitspiration e thinspiration e satisfação corporal.

O estudo mostra ainda, que, apesar de as mulheres serem expostas com mais frequência a estas imagens inspiracionais, tanto homens quanto mulheres podem experimentar menor satisfação corporal ao serem expostos a imagens de fitspiration e/ou thinspiration.

O que você está vendo nas redes sociais?

Atualmente tem ganhado força nas redes sociais um movimento chamado "body positivity" (podemos traduzir por "positividade corporal"). Se você fizer uma busca rápida no Instagram encontrará mais de 3 milhões de publicações para #bodypositivity e mais de 10 milhões para #bodypositive.

O movimento visa desafiar e criticar os ideais de beleza, dando visibilidade para corpos de diferentes formas, tamanhos e cores. O objetivo é promover a aceitação e uma imagem corporal positiva, que envolve o respeito pelo corpo e a apreciação de suas habilidades, funcionalidades e saúde, em vez de se concentrar apenas na aparência. Sugere-se que esse tipo de atitude pode contribuir para benefícios psicológicos e físicos, como maior bem-estar.

Um estudo da Universidade de Tecnologia em Sidney, teve o intuito de investigar o impacto da visualização de conteúdo de "positividade corporal" no Instagram sobre o humor e a imagem corporal. Foram recrutadas para essa pesquisa 195 mulheres entre 18 e 30 anos, através de anúncios em panfletos e redes sociais.

Os participantes acreditavam estar participando de uma pesquisa sobre "Instagram e memória". Na chegada ao laboratório de pesquisa, as participantes sentaram-se em frente a um computador para acessar imagens no Instagram. Elas responderam perguntas sobre satisfação corporal e humor antes e depois de serem expostas a três tipos de conteúdos de contas selecionadas pelos pesquisadores: postagens de "body positivity", ideais de beleza e imagens neutras (como paisagens).

A breve exposição ao conteúdo de "body positivity" foi associada a melhorias no humor e na satisfação corporal. A visualização de imagens com um ideal de magreza foi associada com redução do humor e da satisfação corporal. E a exposição a posts neutros não teve impacto nos resultados da imagem corporal, mas foi associada a melhorias no humor.

Porém… tanto a exposição ao conteúdo de "body positivity" quando de ideal magro foi associado ao aumento da auto-objetificação. A auto-objetificação diz respeito a visualizarmos nossos corpos como objetos a serem observados e avaliados com base na aparência. Ou seja, em ambos os casos as mulheres deram mais atenção à aparência após a visualização das postagens.

A ideia de uma positividade corporal é bem interessante e importante, mas é preciso ter cuidado para o foco não continuar no corpo. Também pode surgir uma pressão para amar nossos corpos, quando nem todo mundo está preparado, pois isso é um aprendizado que pode levar muito tempo. Por isso, prefiro a ideia de "body neutrality", ou seja, nem amar nem odiar nosso corpo, mas fazer as pazes e aceitá-lo como é.

O que podemos fazer?

Mais estudos precisam ser realizados, para termos resultados mais conclusivos e que elucidem as relações de causa e consequência. Ainda não é possível responder se as redes sociais afetam nossa autoestima e satisfação corporal ou se as pessoas insatisfeitas e com baixa autoestima têm mais probabilidade de usar as redes sociais.

No entanto, o que sabemos até o momento é suficiente para entender que as redes sociais podem afetar as pessoas de formas diferentes e que seu uso inadequado pode trazer consequências negativas para a saúde mental, autoestima e insatisfação corporal. Mas não dá para dizer que as redes sociais são ruins… O mais importante é usá-las com consciência.

Reflita sobre como você está usando as redes sociais. Seja crítico em relação ao que você vê e segue. Faça um "detox" dos perfis que podem estressar ou desafiar seu bem-estar. Porque continuar acompanhando um perfil que te traz sentimentos ruins? Esteja sempre atento com seus filhos, ensine-os a usar as redes de forma segura. Procure páginas com conteúdos que te façam bem. Quando puder, faça uma pausa e participe de atividades que não envolvam o uso do celular!

Bon appétit!

Sophie Deram

Sobre a autora

Sophie Deram é uma nutricionista franco-brasileira, autora do best-seller “O Peso das Dietas”, palestrante, pesquisadora e doutora pela Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) no departamento de endocrinologia. Defende a importância do prazer de comer para a saúde e a ideia de comer melhor e não menos. Sophie não acredita nas dietas restritivas e no “terrorismo nutricional”. Desenvolve programas online para transformar a relação das pessoas com comida e ensina profissionais de saúde sobre nutrição que alia ciência e consciência.Leia mais no site da Sophie Deram: https://www.sophiederam.com/br/

Sobre o blog

Dicas, reflexões e estudos sobre a relação do nosso corpo com a comida, com foco em alcançar uma relação tranquila com os alimentos e, assim, obter um peso saudável. Esse é um espaço que passa longe dos modismos alimentares. Aqui promoveremos mudanças de hábitos que vão te ajudar a viver melhor. Acredito que o ser humano se nutre de alimentos e sentimentos.