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OMS desiste de apoiar campanha que incentiva dietas com base em plantas

Sophie Deram

10/04/2019 04h00

Crédito: iStock

O movimento EAT Lancet foi lançado no dia 16 de janeiro de 2019, alegando que uma alimentação à base de plantas seria a solução, "baseada em evidências", que todos nós esperávamos para salvar o planeta e nossa saúde.

O que é o EAT Lancet?

De acordo com o comunicado de imprensa, a iniciativa EAT foi idealizada pela milionária modelo-médica Gunhild Stordalen, ativista na defesa dos animais e ambientalista, que se casou recentemente com outro milionário Petter Stordalen, no casamento mais caro da Escandinávia. Lancet é uma revista científica muito bem conceituada que apoia o movimento.

A Gunhild defende este novo movimento "baseado em plantas" e fala de maneira muito convincente sobre o mandato que eles têm de revisar as políticas nutricionais e econômicas internacionais em parceria com a Organização Mundial da Saúde (OMS), que inicialmente se comprometeu a patrocinar o movimento.

Walter Willett, professor da universidade Harvard, é o cientista responsável pelas questões nutricionais no conselho consultivo da EAT. A Fundação EAT produziu uma campanha de divulgação bem financiada, que contou com numerosos eventos internacionais no começo de 2019. O discurso tem sido na mesma linha do que a tendência vegana do momento, uma solução que supostamente poderia salvar o nosso planeta.

O lançamento contou com um grande evento da Comissão EAT-Lancet sobre Alimentação, Planeta, Saúde em Genebra, Suíça, com patrocínio do governo da Noruega. Foi um evento muito emocionante e empolgante! Participantes e seguidores ficaram com a sensação de fazer algo bom para o planeta e para si mesmo. Bastava acreditar e seguir os conselhos da comissão.

O movimento se baseia em evidência científicas?

No entanto, precisamos questionar se realmente existem as bases científicas que nos permitiriam chegar a conclusões tão enfáticas e simplistas. Estamos falando aqui de algo extremamente complexo que mistura (entre outros) clima, sustentabilidade ambiental, epidemiologia, ativismo em defesa dos animais, crenças religiosas e o nutricionismo (nutrição + cientificismo) da ciência da nutrição somente focada nos nutrientes, sem contar os interesses comerciais das empresas fundadoras que tentam conquistar os corações e as mentes dos consumidores. Estamos lidando com mercados multi-bilionários!

Dia 9 de abril de 2019, a OMS desistiu de patrocinar essa iniciativa global.

Isso ocorreu após o Gian Lorenzo Cornado, embaixador da Itália e representante permanente do país junto às organizações internacionais em Genebra, questionar as bases científicas de dietas focadas na promoção de alimentos predominantemente vegetais e excluindo alimentos considerados "não saudáveis", como carne e outros alimentos de origem animal.

Cornado alertou que uma mudança global para essas dietas poderia levar à perda de milhões de empregos ligados à pecuária e à produção de alimentos processados "não saudáveis" e destruir as dietas tradicionais que fazem parte do patrimônio cultural dos povos. Segundo ele, a iniciativa "pedindo um controle centralizado de nossas escolhas alimentares" arriscaria "a total eliminação da liberdade de escolha dos consumidores".

Imagino que essa novela vai continuar e estou assistindo a esses debates preocupada com os possíveis impactos na saúde física, mental e social das nossas populações. É claro que nós deveríamos privilegiar os alimentos vegetais e diminuir o consumo de carne nas populações onde o consumo é alto, mas não temos que ser tão radicais. Precisamos respeitar também a liberdade de escolha de cada consumidor.

Uma dieta vegana bem orientada e com controles regulares para evitar eventuais carências, como da vitamina B12, pode ser saudável, mas insisto na importância de escolher um profissional de saúde muito experiente que pode guiar esse modo de alimentação. Não podemos nos inventar vegano de repente sem colocar em risco a nossa saúde.

Nas últimas semanas vários blogueiros com milhões de seguidores que promoviam dietas veganas anunciaram ter abandonado as condutas extremas que seguiam, devido a problemas de saúde. Como em tudo, é importante ter moderação quando se trata de alimentação. Sempre recomendo fazer às pazes com a comida e seu corpo!

Bon appétit!

Sophie Deram

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Sobre a autora

Sophie Deram é uma nutricionista franco-brasileira, autora do best-seller “O Peso das Dietas”, palestrante, pesquisadora e doutora pela Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) no departamento de endocrinologia. Defende a importância do prazer de comer para a saúde e a ideia de comer melhor e não menos. Sophie não acredita nas dietas restritivas e no “terrorismo nutricional”. Desenvolve programas online para transformar a relação das pessoas com comida e ensina profissionais de saúde sobre nutrição que alia ciência e consciência.Leia mais no site da Sophie Deram: https://www.sophiederam.com/br/

Sobre o blog

Dicas, reflexões e estudos sobre a relação do nosso corpo com a comida, com foco em alcançar uma relação tranquila com os alimentos e, assim, obter um peso saudável. Esse é um espaço que passa longe dos modismos alimentares. Aqui promoveremos mudanças de hábitos que vão te ajudar a viver melhor. Acredito que o ser humano se nutre de alimentos e sentimentos.